sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Cansado


Sexta feira, são quatro horas da tarde. O dia começou cedo e a rotina se repete há mais de uma semana. O trabalho é bom, mas cansativo demais. Nossos motivos talvez sejam nobres, mas esse não é o caso daqueles que nos pagam. Até que ponto o trabalho vale a pena? No fim me parece que nossos esforços, preocupações e visão de mundo são reduzidos a mera burocracia a ser vencida por grandes empreendedores, os homens do dinheiro, do “progresso” que dirigem seus carros caros e empresas corruptas. E quer saber onde os alvos de nossos esforços e preocupações vão parar? Em baixo d’água. Não importa o quão diversa é a mastofauna da região, ou se há uma área de reprodução de tracajás no caminho. Eles só querem seguir um protocolo, como manda a lei, e após a descoberta de uma diversidade de mamíferos, aves, répteis, peixes, sem falar em terras de pessoas que moram nas proximidades dos rios e que deles dependem tudo será inundado para a construção de mais uma barragem. Lembram do Bico do Papagaio? Região de tríplice fronteira entre Maranhão, Pará e Tocantins. Essa é parte da área que vai para baixo d’água. A idéia é tentar amenizar os impactos do empreendimento, mas o fato é que vai morrer muito bicho e não há nada que se possa fazer. Eles até nos chamam para fazer um “resgate de fauna” que consiste no seguinte, eles inundam a área e nos chamam para pegar os bichos que ficam nadando desesperados e os que ficam ilhados em arvores, pedras, ilhotas. Uma pergunta boa é: o que se faz com esses animais? Há alguns destinos possíveis. Muitos são soltos em uma outra área qualquer, é claro que a maioria não sobrevive. Também podem ser mortos para a coleção de museus ou universidades, ou simplesmente mortos. E as pessoas ainda ficam emocionadas quando vêem um bando de biólogos soltando um bando de animais que vieram de resgate, doce ilusão..

Talvez as pessoas precisem de ilusões, títulos, uma posição que diga quem você é; uma distorção brutal da realidade que diga: “olha como a empresa X se preocupa com o meio ambiente, ela faz um resgate de fauna” e poucas pessoas sabem que a realidade é bem diferente e que o conhecimento de tal realidade não é algo fácil de se aceitar. Na verdade a realidade vendida é uma mentira absurda e vai de encontro a tudo aquilo que você acredita. O que pode se fazer então? Simplesmente aceitar as coisas como são? Talvez o tormento gerado com essa situação seja uma pequena vertente da loucura vista pelo buraco de uma fechadura, onde começamos a avaliar nossas ações, mudanças de comportamento, incoerências. É como se por um estante observassemos um erro intrínseco aos seres humanos, sua bestialidade e ego gigantesco e o ponto de partida pode até ser uma grande empresa que estupra nossa fauna e nossas terras, mas no fim começo a ver o mar de incoerências que sou e quanta coisa errada há em mim. Uma empresa dessas, com uma política dessas é apenas um reflexo em grandes proporções dos erros intrínsecos humanos. E que os outros seres vivos paguem por nossos erros. Talvez eu esteja ficando louco, ou apenas cansado...

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

O homem que não estava lá


São seis e cinqüenta da manhã, as pessoas estão chegando para a missa de um Domingo chuvoso de novembro. Fuleiro está ao meu lado, ele nunca sai do meu lado. É mesmo um companheiro fiel com seus 10 anos de idade, pelo preto esfarrapado, algumas sarnas, rabo sempre abanando e algumas histórias ao meu lado. O padre é um homem interessante, sou capaz de passar horas conversando com aquele homem de setenta e um anos de idade. Sempre é muito gentil comigo e com Fuleiro. Vemos todo tipo de gente passar por aquela porta, de cabeça baixa fazendo o sinal da cruz em sinal de profunda devoção. As pessoas são intrigantes com sua demonstração de fé, as beatas vêm a igreja quase todos os dias, fazem suas doações todos os domingos e rezam o terço ao menos uma vez por dia. É impressionante como muita são incapazes de demonstrar qualquer sinal de compaixão. Para elas nunca pedi nada, mas o Fuleiro é incansável e eu admiro isso nele. Certa vez meu amigo canídeo foi todo contente com seu rabo abanando na direção de dona Zilda, uma beata ortodoxa que deu um chute na anca de meu amigo que ficou mancando por três dias. Olhei bem em seus olhos tristonhos e disse: “é a vida meu velho..”

As pessoas continuam chegando e começam a tocar as sete badaladas do sino e logo vejo duas crianças chegando, são os irmãos Carlos e Davi. Estão meio atrasados para a missa já que são os coroinhas. São crianças educadas, uma das poucas pessoas que ao entrar na igreja me olham nos olhos, desejam bom dia e às vezes trazem algo para o Fuleiro comer. O Fuleiro os adora. É uma pena que os adultos não sejam tão cristãos quanto esses garotos. Na porta da igreja quem os espera é Ulisses, professor de catecismo e está com cara de poucos amigos. Homem muito severo que está sempre a gritar com os meninos, não sei que tipo de coisa um cara desse pode ensina para esses garotos. Confesso que temo por eles...

Logo vejo aparecer na esquina a passos apressados Paulo. Hoje ele veio com Carla, ele aparece a cada domingo com uma mulher diferente. Algumas vezes vem sozinho, é claro. Usa sapatos finos, perfume caro e está sempre bem acompanhado. Tem um olhar arrogante e é uma das poucas pessoas que não baixa a cabeça em frente ao altar ao entrar na igreja e fazer o sinal da cruz. Deve ser alguma “autoridade”. Acho que o padre gosta de conversar comigo porque eu conheço todos os seus fiéis, eu os conheço de verdade. Fazem sete anos que eu e Fuleiro habitamos as ruas próximas à igreja e aos domingos pedimos esmola. Com o tempo você acaba conhecendo as pessoas e elas te mostram um lado não muito bom de se conhecer. São sete e vinte da manhã, eu não me sinto muito bem... sinto um aperto em meu coração e não é saudade, me deito no chão, Fuleiro sabe que não estou bem. Ele me conhece. Vem até mim, lambe meu rosto e digo para ele: “fique tranqüilo velho amigo você vai ficar bem, o padre cuidará de você”. Fecho meus olhos e um trecho de um livro de Bukowski que li há muitos anos me vem à mente “Não há nada a lamentar sobre a morte, assim como não há nada a lamentar sobre o crescimento de uma flor. O que é terrível não é a morte, mas as vidas que as pessoas levam ou não levam até a sua morte. Não reverenciam as suas próprias vidas, mijam em suas vidas. As pessoas as cagam. Idiotas fodidos. Concentram-se demais em foder, cinema, dinheiro, família, foder. Suas mentes estão cheias de algodão. Engolem Deus sem pensar, engolem o pais sem pensar. Esquecem logo como pensar, deixam que os outros pensem por elas. Seus cérebros estão entupidos de algodão...” Bukowski pode estar certo, mas pessoas como aquele padre e aquelas crianças ainda me fazem ter um pouco de fé em nossos semelhantes. Fique em paz velho amigo...

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Espírito Esportivo

Nessa semana o Brasil comemorou uma vitória internacional, o Rio de Janeiro vai ser sede das Olimpíadas no ano de 2016. Eu, nadando contra a maré, não comemoro. Não é por falta de patriotismo, quero sim que o Brasil tenha esse papel um dia, mas acho que ainda não é a hora.

Não vou nem comentar o possível desvio de verba que vai existir nessas obras, que se for na mesma proporção do Pan (gastamos 14 vezes mais que a expectativa) será 14 vezes 25,9 BILHÕES de reais. Façam a conta!

O que me faz pensar que agora não é a hora é a situação do povo brasileiro. Todos sabemos que o Brasil é um país rico, e que esse dinheiro existe (até mesmo multiplicando por 14), mas o esporte no Brasil é fraco e pouco incentivado. Não que os brasileiros não sejam bons no esporte, porque nós somos, e muito. A prova disso é o vôlei ou o futebol, esportes com incentivo econômico e que somos imbatíveis, mas no resto dos esportes só temos campeões por pura teimosia do povo tupiniquim.

Imaginem o que esses R$ 25,9 bilhões fariam investidos nos esportes. Não desejo as medalhas, e sim o crescimento socioeconômico que isso traria. Diariamente podemos ver o que projetos esportivos em localizações carentes podem fazer pelas crianças, agora imaginem o que faria com a população se essas crianças pudessem seguir uma carreira estável e lucrativa no esporte que gostam. O esporte é uma forma de diminuir as diferenças econômicas. Imaginem se o César Cielo pudesse treinar aqui no Brasil e não no exterior. E se adolescentes carentes pudessem levar a frente uma carreira de judoca, capoeirista, nadador...

E tem mais, temo pela imagem do povo brasileiro. No Pan tivemos a prova de que não temos a maturidade e a educação para assistir a esportes. Pudemos ver que o povo brasileiro não sabe se portar diante de competições que não sejam o futebol, talvez nem mesmo no futebol. Vaiar os competidores que ganham de brasileiros é uma vergonha. É uma vergonha que não quero mais sentir! E mais uma vez, se o esporte for incentivado de forma eficiente, o processo de educação é natural. A partir do momento que competições se tornam populares, se portar de forma adequada se aprende naturalmente.

Entendo que as obras farão muito bem para a cidade do Rio de Janeiro, vejo a quantidade de empregos que vão surgir durante as obras e é óbvio que incentiva o turismo. Mas tudo isso poderia ser feito sem as Olimpíadas. E parte do problema é esse, só vamos arrumar o que é nosso para gringo poder ver, porque arrumar para nós faz pouco sentido.

Aí sim, depois de termos uma base esportiva forte poderíamos sediar as Olimpíadas, e incentivar ainda mais o esporte e a competitividade civilizada. Mas no Brasil, o “país da contradição”, nada disso importa, tudo é feito às avessas. Mas vamos torcer juntos para que eu esteja redondamente enganado!

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Jesus Numa Moto


Acredito que quase todos os seres humanos conhecem ao menos um pouco da saga de cristo sobre a terra e de seus sacrifícios pela humanidade. A palavra cristão reflete uma série de posturas e condutas a serem tomadas diante de situações, não tem nada haver com o culto a Deus. Cristo teria vindo a terra para nos ensinar a ser cristãos, agir com ética, pensar no outro, ser mais cauteloso nos julgamentos e ações, não é isso? Ele viveu um exemplo, não poderia haver melhor forma de ensinar às pessoas. Para completar ainda fez uma série de milagres para tentar provar para nós homens que sua conduta em vida era um exemplo interessante a ser seguido. Ele Curou muitas pessoas, ajudou pescadores, espantou demônios, transformou água em vinho (particularmente esse é meu favorito e prova que ele não era um careta). Ele era contra as instituições, afinal lutou contra as da época e disse que aqueles que quisessem encontrar a palavra de Deus não precisariam recorrer às instituições; isso é genial! Não que eu tenha algo contra qualquer instituição, acredito que a existência delas é benéfica quando oferecem abrigo e promovem conforto para os que sofrem. Contudo, hoje não é o que vemos. A igreja do senhor Edir Macedo, por exemplo, é uma grande maquina de lavagem de dinheiro e que tira justamente de quem não tem e agora ainda está expandindo seus negócios para as terras africanas em uma forma absurda de neocolonialismo que engana as pessoas pela fé.

Quando era criança havia um mito de que nós não poderíamos “matar” a missa, pois esse seria um pecado mortal! Putz! Mas o Cristo lutou contra as instituições e as pessoas vem me dizer que eu tenho que ir à igreja para não ir para o inferno? Tem algo errado aí. Em o Anticristo de Nietzsche ele diz que o evangelho morreu na cruz. E ele estava certo. Depois de Cristo ter feito milagres, vivido um exemplo, e sacrificado sua própria vida para entendermos uma mensagem os homens foram capazes de perverter a lógica e o significado do trabalho de sua vida. Detesto admitir isso, mas cristo estava errado. Ele acreditava nos homens, mas não dá para acreditar em todos. Se hoje ele voltasse à terra acredito que faria tudo de novo, mas gostaria que houvesse uma exceção. Que ele tentasse nos mostrar de todas as formas como poderíamos ser cristão e se fossemos incapazes de compreender o recado novamente ele deveria fugir e viver em paz, muitos homens simplesmente não valem o sacrifício; adoraria ver cristo fugindo em uma moto.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Discotecando


Ao som pesado dos Stones (Let It Bleed) começo o primeiro, do que eu espero ser muitos, da série intitulada “Discotecando”. A idéia é sentar e discotecar para mim mesmo, escolher algumas músicas e documentar. Pretendo simplesmente me divertir ouvindo música e, como gosto de conversar sobre as músicas que estou ouvindo, começar um bate papo com você que me lê. Ah sim, aceito sugestões!

Bem, o fim de “let it bleed” não saciou minha cede de Stones, então continuo com eles com a música “sympaty for the devil”. A música é muito boa, me lembro da primeira vez que ouvi. Era mais tarde do que ela merecia, não me lembro exatamente do ano, mas já estava na faculdade. Ela é uma dessas músicas que quando você começa a ouvir você tem que continuar ouvindo até acabar, e na primeira vez, ela te deixa pensando sobre ela por alguns minutos, é aquela música que não acaba quando sua última nota é tocada.

Os Stones me lembra muito o country americano, aquele com uma forte influencia do blues. Por isso continuo nesse estilo country-blues e coloco uma do Creedence Clearwater Revival (fortunate son). Olha, escolher uma do CCR é sempre muito difícil, os caras tinham as manhas de fazer hits, porque eu acho que todas as músicas deles são hits, e é uma daquelas bandas que é difícil encontrar quem não goste.

Agora, no blues nacional, vou com “dente de ouro” do Blues Etílicos. Acho fenomenal o que os brasileiros conseguem fazer com o ritmo internacional, e como a mistura fica excelente. Nessa música o berimbau faz toda a diferença. Sem ele a música não teria a riqueza que tem, não teria o seu charme.

Continuando em terras Tupiniquins, damos de cara com “blues do elevador” do Zeca Baleiro. Essa música é muito boa, particularmente a letra. A riqueza da música está em versos inteligentes, como “as pombas podem voar alto, mas insistem em catar as migalhas no chão”, bem encadeados e num ritmo muito gostoso.

E num pequeno salto escolho “réu confesso” do Tim. Nem sei direito o que falar sobre essa música, nem sobre o cara. Mas é isso aí, muitas músicas a gente não precisa comentar, é só para e ouvir. Um beijo e até a próxima!

sábado, 26 de setembro de 2009

Uma quinta qualquer



Eram 20h de uma quinta-feira de setembro, a noite estava quente, o mercado central estava lotado. Ele estava entre muitos outros pendurado no balcão e grita:

- Traz outra aí irmão!

Termina seu copo em dois goles sedentos enquanto espera aproxima. O mercado é um lugar bem interessante, tem muita raça de gente. Tem o cara que trabalhou o dia inteiro e está ali para dar uma relaxada antes de ir para casa, o bêbado que ficou o dia inteiro alugando os fregueses e entornando, o estudante que acabou de sair da aula, as belas moças do tambor de crioula, o traficante fazendo a sua “correria” e também as mulheres fáceis. Uma em especial me chama a atenção, seu perfume barato se mistura com o cheiro de camarão seco e cerveja choca derramada no chão. Seus olhos passeiam pelos rostos dos homens que estão ali, ela quer companhia e provavelmente acabará na cama de alguém. Sua idade aproximada deve ser de uns cinqüenta anos, ela não parece ser muito seletiva, mas ainda tem um certo critério. Ela olha para ele, isso o leva a pensar “É minha amiga... ainda falta muita cerva..” isso faz com que ele dê uma risada discreta, ela percebe, mas não compreende o real significado. Ele deixa para lá, dá uma longa golada em sua cerva e mergulha em outros pensamentos.

Outro dia havia sentado para comer um cachorro quente com um amigo e apareceu um cara que conhecia o amigo. Começaram a conversar e logo o cara começou a falar de Deus. Ele pensou “putz... lá vamos nós de novo”. Para o figura Deus era o caminho, um guia que tinha todas as respostas. O cara realmente acreditava que Deus tinha falado com ele e o que disse foi:

- É figura é isso aí...

Essa era a prova que o sujeito tinha de que Deus existe. Para ele o cara era só mais um maluco entre tantos em São Luís, perdido em pensamentos confusos que levavam a certezas inconsistentes. Mas um ponto em particular na argumentação do figura o incomodava mais que outros, por que ele precisava provar que Deus existe? A religiosidade não é construída com base em provas, mas da fé pura e simples. Ou você acredita ou não. Na ciência sim é preciso procurar evidências que corroborem uma hipótese. Deus não tem que ser comprovado pela ciência e a falta de evidência científica de que ele exista não prova que ele não exista. É prudente dar a ele o benefício da dúvida... pensando nisso ele olha ao seu redor, o mercado já está bem vazio, o irmão está fechando, é hora de partir. Olha uma imagem de cristo na parede do bar, joga um pouco de cerveja no chão e levanta o copo em direção a ele num brinde e sinal de respeito , larga o copo no balcão e deixa a feira para trás.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009


Era um sábado à noite, eu estava em minha casa bebendo uma boa e velha cerveja com uns amigos e ouvindo uma boa música. A noite foi seguindo, as músicas tocando e os amigos acabaram indo embora. No final ficamos eu e o blues sofrido do Big Walter. Com certo nível de álcool no sangue, ao som dessa música maravilhosa eu estava no terreiro nos fundos da casa onde moro olhando para a lua e comecei a pensar... Ela está sempre linda, me acompanhando onde quer que eu vá. Sempre a olhar por mim, ela meche comigo e não há nada que se possa fazer. Eu Tenho 25 anos, não tenho muito dinheiro no bolso, mas me considero um homem simples e razoável. Trabalho fazendo aquilo que gosto. Nunca ficarei rico, mas a felicidade é para pouca gente.. minha paixão pela vida que resiste nesse planeta não tem fim. Eu não tenho respostas.. e Vamos combinar, se Deus existe ele tem muito mais o que fazer do que ficar olhando por mim. Tem gente muito mais interessante e carente do que eu nesse mundo, apesar de eu adorar a minha vida.

Moro em uma cidade brasileira cuja cultura está enraizada na alma das pessoas desse estado. As pessoas aqui tem orgulho de sua negritude, não são guiadas por uma estética narcisista de culto ao corpo. A beleza aqui está nas raízes. Em manifestações culturais como um tambor de crioula onde é possível ver meninas lindas e novas dançando ao lado de lindas senhoras. Nessa terra o idoso é saudável, brinca dança e bebe cachaça. Não estou idealizando o povo. Essa é uma cidade super violenta, mas como diria Lenine:” nós temos violência e perversão mas temos o talento e a invenção desejos de beleza em profusão idéias na cabeça, coração, a singeleza e a sofisticação o choro, a bossa o samba e o violão“. É assim em São Luis.

Em meu caminho sempre aparecem pessoas interessantes e uma delas é um camarada que mora comigo, um capoeira de cerca de 48 anos, que bebe uma boa e velha cerveja e tem muito o que ensinar para um cara como eu.. talvez, o destino de um sujeito esteja em seu espírito que não lhe dá sossego até que os fins sejam alcançados e por isso ele anda, vai onde tem que ir. É muito bom conhecer as pessoas cujos caminhos acabam cruzando com os seus. Talvez uma pessoa deva passar por essa vida e ter algumas sensações plenas. Uma delas seria amar incondicionalmente com toda a força que seja possível amar alguém. Uma outra que consigo pensar no momento é ouvir um blues na tranqüilidade de um lar em uma cidade que lhe acolheu e ter reflexões que um careta nunca entenderia ou conseguiria alcançar, é uma sensação única, sublime, de paz, solidão e um forte sentimento de identidade por que sabemos que não estamos tão sozinhos nesse mundo e somos totalmente livres.

Liberdade é uma palavra simples, mas a compreensão de seu significado pode ser complicada para alguns que quando vêem alguém livre se assustam e nos fuzilam com preconceitos por não conseguirem entender alguém de espírito livre. Essa seria a hora de terminar esse texto com uma idéia inteligente e chamativa, mas não é o caso por isso me resumo a um breve até logo e que os nossos caminhos se cruzem...

sábado, 5 de setembro de 2009



Cássio acorda com uma gargalhada alta que ecoa do corredor para dentro de seu quarto. A cama ao seu lado está vazia.
“Julho já acordou, provavelmente está babando na fila do café”.

Olha pela janela gradeada e vê o sol brilhando num céu azul imponente, levanta e se volta mais uma vez para a janela, agora vê o pátio de entrada, a grama está verde e molhada.

“Talvez uma das maiores preocupações da administração do local, a grama verde na época da seca dá uma idéia de zelo para os nossos parentes. E não adianta tentar mudar a idéia deles, a grama verde é uma prova muito mais confiável do que as palavras de um louco”.

Cássio já estava acostumado com a rotina, mas não havia desistido de sair do sanatório. Tentava se parecer o mais normal possível, mas a doutora Carla insistia em mantê-lo lá durante meses cada vez mais cumpridos.

Um enfermeiro, magro, baixo, sempre com uma barba por fazer, entra no quarto e se dirige ao Cássio.

-Dormiu bem, Cássio?

-Sim, obrigado. – Cássio gostava do enfermeiro Lucas, era o único que nunca perdia a paciência com os pacientes, nem mesmo com os mais difíceis.

-Vamos, está na hora do desjejum e dos remédios. Julho está na fila e está insistindo para que alguém te chamasse.

Julho se afeiçoara ao seu companheiro de quarto, Cássio costumava dar atenção aos seus devaneios em conversas que costumavam durar horas. Na verdade Cássio descobrira o quão fascinantes as idéias daquele lunático podiam ser se alguém prestasse atenção nelas. A doutora Carla já o havia censurado por incentivar as “alucinações” de Julho! Cássio às vezes pensava ser esse o motivo principal para ainda estar naquele prédio para loucos.

Ele compreendia que a doutora o havia ajudado muito, a situação em que se encontrava quando entrou era dramática. Sua mulher e filhos nem vinham visitá-lo no começo, depois de um tempo sua mulher vinha sozinha e há pouco tempo trazia seus dois filhos. Era tão bom vê-los, e tão doloroso não poder voltar para casa com eles no final da visita, talvez devesse diminuir as conversas com Julho.

Cássio se encaminha para o refeitório e lá está Julho, ansioso, mudando o peso de seu grande corpo de uma perna para a outra. Julho, ao ver seu grande amigo, acena rapidamente mostrando o lugar à sua frente.

-Guardei o lugar na minha frente para você, as maçãs podem acabar! – no fim, Cássio sempre dava sua maçã a Julho, que sempre recusava de primeira, mas depois de um tempo, ao ver a maçã parada na bandeja, sempre a pegava e saía correndo para frente da TV, em outro cômodo.
-Muito obrigado Julho.
-Dormiu bem, Cá?
-Dormi sim, aqueles comprimidos que me dão antes de dormir me derrubam!
-É porque eles não querem que a gente sonhe!
-E por que eles não querem isso? – Perguntou Cássio, sendo lembrado porque era tão difícil não
conversar com aquele maranhense lunático. Cássio sabia que Julho já havia sido um homem muito bem sucedido, dono de uma empresa de softwares. Já disseram a ele que Julho fora um grande gênio, criara softwares geniais, mas que de alguma forma perdera a empresa. Foi aí que as coisas ficaram ruins. Seu nome não é Julho, mas ele insisti em ser chamado assim!
-Porque nossos sonhos nos mostram a verdade!
-Verdade sobre o que?
-Sobre tudo! Sobre a grama lá fora, sobre as maçãs, sobre a chuva ou a falta dela! Sobre nossos filhos e nossas mulheres, sobre o que é certo e sobre o que está torto. Explica o porquê da vida, do mundo, do nada, de tudo!
-Você sonha, Julho?
-Sonhava, é por isso que estou aqui, é para reconquistar meus sonhos, eu parei de ver a verdade!
-Você acha que a doutora Carla sonha?

Julho pensa por alguns segundos, depois responde:

-Ela te ajudou?
-Sim...
-Então deve sonhar.
-Mas se ela quer nos ajudar, então por que não quer que eu sonhe?
-Você não deve estar preparado para a verdade. Mas acho que se você se esforçar você vai conseguir sonhar, ou até mesmo lembrar o que você deveria ter sonhado essa noite.

Cássio começou a pensar sobre a importância dos sonhos, e que já lera que apesar de ninguém saber exatamente para que servem os sonhos, eles são muito importantes para a saúde mental. De certa forma Julho poderia ter razão. Começou a tentar lembrar do seu sonho daquela noite.

A fila começou a andar, Julho ficou entusiasmado, Cássio foi andando seguindo o ritmo da pessoa a sua frente, foi servido de um mingau fedido e fumegante e quando estava preste a pegar sua maçã a memória do seu sonho reapareceu de uma vez. Um turbilhão de imagens esmurraram seu cérebro e no fim, uma voz rouca, num grito, lhe falara:

-Ainda falta muito!

Cássio solta uma gargalhada assustadora, joga o mingau na cabeça da pessoa à sua frente, segura sua maçã com a boca e sai correndo em direção à janela gradeada. Num grito abafado pela maçã começa a esmurrar as grades.

Julho se vira para o pobre homem queimado pelo mingau e diz:

-Desculpe ele, ele não estava preparado...

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Vão se fuder! Parte 2


Sinceramente, não tem época melhor para eu escrever essa segunda parte do texto do que essa em que nos encontramos. A pouca vergonha generalizada dentro daquele antro de ladrões está cada dia mais evidente. Essa segunda parte é sobre a impunidade no governo.

Há muito tempo já havia escrito algo defendendo o meu voto nulo, dizia que só votaria nulo porque não entendo, não gosto e não acompanho política. E isso não deixou de ser verdade, mas meus motivos para o voto nulo mudaram drasticamente.

Primeiro, ninguém realmente sabe em quem votar com 100% de certeza de que aquele candidato é o ideal. Se achar que tem certeza ou é desinformado, ou muito inocente, ou pior, desonesto e sabe que com aquele candidato ele vai se dar bem de alguma forma desonesta.

Segundo, estou para ver um político honesto! E quando digo honesto não quero dizer que simplesmente não roube, a honestidade é um conceito superior a isso. Uma pessoa honesta honra suas promessas, age com decência, não se deixa levar por pessoas de má índole. Uma pessoa honesta luta contra a desonestidade, antes de qualquer coisa!

Terceiro, o sistema incentiva esse bando de parasita a se tornar coisa pior! Eles legislam as próprias leis! Dessa forma eles conseguiriam enriquecer “legalmente”! E essa merda de imunidade parlamentar, que é um abuso do nosso bom senso, é um estupro da nossa paciência, porque esses canalhas praticamente não podem ser presos. Se roubou, tem que pelo menos ser preso, mas nada acontece, o cara, na melhor das hipóteses, renuncia (para nas próximas eleições poder voltar e continuar roubando).

Mas eles não param de nos surpreender! Diariamente aparecem novos absurdos! Mas ultimamente parece estar cada vez pior.

Não bastou Fernando Collor (o cara que cagou na retomado do processo democrático brasileiro) ser eleito como senador, não bastou José Sarney ser presidente do Senado, não bastou o Lula (em quem eu admito ter votado e que até bem pouco tempo atrás ainda o tinha com certa, apesar de bem menos do que já tive, consideração. E me citando “Uma pessoa honesta luta contra a desonestidade, antes de qualquer coisa”) ter se pronunciado a favor desse pilantra para ganhar maioria no Congresso, agora a gente tem que ficar vendo nos noticiários a baixaria que estava se passando dentro do senado.

Não digo baixaria pela revolta de alguns (revolta que eu particularmente não considero tanto porque eles só estão atrás dos próprios benefícios, mas que pelo menos estão brigando pelo certo), mas é uma merda esses cornos desonestos não terem a decência de se calar diante das provas de sua cada vez mais evidente podridão.

O Sarney teve a ousadia de falar que estava sendo perseguido pela mídia! Não, isso é uma ofensa à inteligência de todos nós brasileiros. Ele faz merda, nos rouba, descobrem e ele é o coitadinho por estar sendo perseguido. A mídia é a vilã nessa história (tá, ela não é santa!) por estar descobrindo os podres dele e de mais ninguém! Ahhhh Sarney, vá a merda, seu filho da puta!

A coisa é tão feia que a defesa dele é o Collor! Mas, nós brasileiros ficaríamos muito satisfeitos se fosse só essa a vergonha nisso tudo. O maior problema é que de uma hora para outra os ânimos foram se acalmando, os discursos foram ficando mais educados, chegou a ponto de quem estava brigando pelo certo pedir desculpas (?!?!?!?!) e pronto, todas as acusações estão sendo arquivadas!

A crise no senado acabou, todos no governo estão felizes e contentes e nós, brasileiros, mais uma vez nos curvamos para que eles continuem a nos fuder!

Dessa forma, o Brasil vai cada vez mais para o buraco. Nessa segunda parte do meu texto o foco é a impunidade no senado e na câmara. E o que podemos fazer? Eu não sei, votar com consciência não adianta, quem tem que ter consciência são eles e não nós! Manifestações com caras pintadas... Também não sei se funciona, eles tem tudo a favor deles, porque o Sarney ainda vai ser eleito, o Collor ainda vai ser eleito, o Lula ainda vai ser eleito e, que Deus nos ajude, Dilma será eleita...

Eu pensei numa forma de resolver o problema, alguém tinha que ter colhões e sair matando todos os políticos que roubassem. Matasse mesmo! Tiro na cabeça, facada nas costas, atropelamento, bomba, tortura, decapitação, castração... Dessa forma talvez os políticos passassem a pensar duas vezes antes de roubar, mas sabe como é, o povo também é corrupto, logo esse cara iria começar a matar quem lhe interessasse.

Comunidade Carente

Zeca Pagodinho

Eu moro numa comunidade carente
Lá ninguem liga prá gente
Nós vivemos muito mal
Mas esse ano nós estamos reunidos
Se algum candidato atrevido
For fazer promesas vai levar um pau

Vai levar um pau prá deixar de caô
E ser mais solidário
Nós somos carentes, não somos otários
Prá ouvir blá, blá, blá em cada eleição

Nós já preparamos vara de marmelo e arame farpado
cipó-camarão para dar no safado que for pedir voto na jurisdição
É que a galera já não tem mais saco prá aturar pilantra
Estamos com eles até a garganta
aguarde prá ver a nossa reação

sexta-feira, 19 de junho de 2009

É fogo!


Uma vez viajei com um amigo e em uma noite de sexta feira estávamos comendo um sanduíche quando ele viu um cachorro vira lata preto, pequeno e com o pelo todo atrapalhado. Ele então me disse:
— João, se eu fosse um cachorro eu seria igual a esse aí.
Eu que curto os canídeos não poderia deixar passar em branco.
— E eu que cachorro seria?
— João, você não seria um cachorro de raça. Você é muito largado para ser um cão de raça. Você seria um cachorro maior que eu, mas seria um vira lata com certeza!
Eu cai na gargalhada e considerei o comentário um elogio. Eu sou um vira lata, não tem jeito. Acredito que os vira latas são aqueles marginais. Sempre à margem da sociedade, enquanto o cidadão comum estuda para concurso público e garante o seu futuro seguro um vira lata se perde em seus pensamentos e sonhos. Sempre tem mais perguntas que respostas, mais dúvidas que certezas. Não é uma questão de escolha ou moral, nós somos assim e pronto. O fato é que nós nunca somos tão atraentes como os de raça, sempre estamos jogados por aí e a melhor parte é que não ligamos. Essa é nossa natureza, aqueles ao nosso redor podem aceitar ou não. Para nós não faz diferença, somos o que somos. Pagamos o preço por nossa natureza selvagem, a solidão é um preço justo. Nos dá o que pensar e quando encontramos outro vira lata a sensação é maravilhosa, pois sabemos que não estamos sozinhos, temos com quem conversar. Com freqüência a conversa vem acompanhada de uma cerveja gelada e um porre daqueles... não adianta, nós vira latas somos animais sociais e valorizamos muito a compania de outros canídeos. Temos uma história evolutiva que não nos deixa esquecer, somos animais de bando. Precisamos de pessoas como agente. É uma pena que tanta gente não entenda a nossa natureza, nossa necessidade de estar na estrada, conhecer gente, lugares onde possamos nos sentir a vontade, sentir o cheiro do ar limpo e vento em nossos pelos, a água que nos limpa, dá força e mata a nossa sede. Nós nos identificamos com outros animais por que eles são livres, sem rótulos, são o que são, estão sempre no lugar certo. Não há nem uma sociedade que os diga o que devem ser ou que os deixe deslocados. Sem hipocrisia, sem formulas de felicidade ou verdades absolutas eles vivem essa vida que é o que eles tem, é o que conhecem. Nada é mais belo que isso, viver como se essa vida fosse a única, sem Deus, sem paraíso, sem certezas. Não precisamos de Deus para nos salvar, não queremos ser salvos. Ser um vira lata é fogo...