sexta-feira, 19 de junho de 2009

É fogo!


Uma vez viajei com um amigo e em uma noite de sexta feira estávamos comendo um sanduíche quando ele viu um cachorro vira lata preto, pequeno e com o pelo todo atrapalhado. Ele então me disse:
— João, se eu fosse um cachorro eu seria igual a esse aí.
Eu que curto os canídeos não poderia deixar passar em branco.
— E eu que cachorro seria?
— João, você não seria um cachorro de raça. Você é muito largado para ser um cão de raça. Você seria um cachorro maior que eu, mas seria um vira lata com certeza!
Eu cai na gargalhada e considerei o comentário um elogio. Eu sou um vira lata, não tem jeito. Acredito que os vira latas são aqueles marginais. Sempre à margem da sociedade, enquanto o cidadão comum estuda para concurso público e garante o seu futuro seguro um vira lata se perde em seus pensamentos e sonhos. Sempre tem mais perguntas que respostas, mais dúvidas que certezas. Não é uma questão de escolha ou moral, nós somos assim e pronto. O fato é que nós nunca somos tão atraentes como os de raça, sempre estamos jogados por aí e a melhor parte é que não ligamos. Essa é nossa natureza, aqueles ao nosso redor podem aceitar ou não. Para nós não faz diferença, somos o que somos. Pagamos o preço por nossa natureza selvagem, a solidão é um preço justo. Nos dá o que pensar e quando encontramos outro vira lata a sensação é maravilhosa, pois sabemos que não estamos sozinhos, temos com quem conversar. Com freqüência a conversa vem acompanhada de uma cerveja gelada e um porre daqueles... não adianta, nós vira latas somos animais sociais e valorizamos muito a compania de outros canídeos. Temos uma história evolutiva que não nos deixa esquecer, somos animais de bando. Precisamos de pessoas como agente. É uma pena que tanta gente não entenda a nossa natureza, nossa necessidade de estar na estrada, conhecer gente, lugares onde possamos nos sentir a vontade, sentir o cheiro do ar limpo e vento em nossos pelos, a água que nos limpa, dá força e mata a nossa sede. Nós nos identificamos com outros animais por que eles são livres, sem rótulos, são o que são, estão sempre no lugar certo. Não há nem uma sociedade que os diga o que devem ser ou que os deixe deslocados. Sem hipocrisia, sem formulas de felicidade ou verdades absolutas eles vivem essa vida que é o que eles tem, é o que conhecem. Nada é mais belo que isso, viver como se essa vida fosse a única, sem Deus, sem paraíso, sem certezas. Não precisamos de Deus para nos salvar, não queremos ser salvos. Ser um vira lata é fogo...