quinta-feira, 14 de abril de 2011

O mendigo e o gato


Parceria minha e do João Paulo

"hummmmmm... que sono!” - Pensa o gato preto, vira-lata e sem um olho antes de olhar para seu dono. “Será que vamos ficar muito tempo ainda nesse calçadão? Essa movimentação me atrapalha a dormir”. O homem terminava uma imagem de Cristo esculpida na areia, olha a cara do gato acordando meio descontente e pergunta:

- Tá com fome, Fulêro?


“Eu até comeria...” pensa o gato se esfregando nas mãos do mendigo, e depois solta um miado rouco e cansado. “Essas facilidades de ter um dono são ótimas, não sei porque demorei tanto para descolar um.”

Sexta feira é um bom dia, as pessoas vêm à praia e o dono da barraca Marco do Percurso sempre gentil dá uma graninha e um café da manhã pelo trabalho de arte feito na areia, atrativo para turistas. Com a arte terminada o homem caminha tranquilamente até o balcão e comprimenta o dono:

- Bom dia seu Marco! Será que o senhor tem aquele cafézinho para mim e pro Fulêro?

O dono da barraca olha o gato deitado na areia a encará-lo com uma preguiça sobrenatural. O gato se aproxima, sobe no balcão com um salto e se deita perto da caixa registradora. Marco tenta passar a mão na cabeça do gato, mas o felino reage agressivamente, não aceitando o carinho.

“Esses humanos, acham que somos como os cachorros! Os homens têm cães para satisfazer suas próprias carências. Têm gatos para satisfazer às nossas!”

- Perdão pelo comportamento do Fulêro, Sexta feira o movimento começa cedo e ele acorda nesse humor aí.

- Sem problemas. Vou pegar um café com pão para você e para esse porqueira aí um leite com pão.

O dono do estabelimento serve os dois, que devoram a comida e bebida com voracidade. Fulêro ligeiramente mais gracioso que seu dono. Ao terminarem o gato olha para Marco e solta um miado de agradecimento, se limpa e com um salto, sobe no ombro do mendigo e entra na mochila que ele carrega às costas.

“Hora da sesta”.

- Essa é minha deixa seu Marco, muito obrigado pelo café. Até logo!

O homem deixa a barraca aconchegante e volta para a praia. a manhã é agradável e o sol ainda não está tão quente. Ele deita-se sob a sombra de um coqueiro próximo à sua escultura.

Os turistas de Fortaleza vão passando pelo mendigo e apreciando sua arte, uns poucos contribuem com uns trocados. A maioria passa fazendo cara feia, alguns chegandoi inclusive a jogar ofensas como “vai trabalhar, vagabundo”.

Passados algumas horas Fulêro resolve sair da mochila e se deita ao lado do mendigo.

“Está ficando muito quente e a mochila fica muito abafada”

- Esquentou demais lá dentro ou veio me dar apoio moral para a mendicância?

O homem passa a mão gentilmente sob a cabeça do gato uma primeira vez e na segunda dá uma sacudida de leve.

“Vim trazer um ar de beleza para a situação, porque você e essa escultura são horríveis!”

- Não adianta me olhar com essa cara não. Quem sabe com você dando o ar da graça não damos sorte, apesar de você ser preto.

De longe uma moça de cabelos vermelhos vêm se aproximando. A primeira coisa que ela vê é o mendigo e já coloca a mão dentro da bolsa para pegar um trocado. Depois ela vê a escultura e já decide por aumentar a esmola. Por último, visualisa o gato maltrapilho.

- Nossa, esse gato é seu?

E, antes mesmo do mendigo responder se dirige ao gato.

- Psssspsssspsssspssss... shaunim shaunim... Oi gatinho, qual o seu nome?

- Sou o dono dele não moça, esse gato não tem dono. Nos achamos na rua, o encontrei quando uma mulecada dava uma surra nele. Espantei a pivetada e cuidei dele. Mas a decisão de ficar comigo foi dele. O nome dele é Fulêro.

“Oi moça, que cheiro bom têm você” e o gato aceita o carinho da moça. Enquanto ronrona pensa “Que carinho gostoso, diferente do carinho desse brucutu aí!” e pisca o único olho verde para a moça.

- Olha moça eu vou te dizer que isso não é nem um pouco comum da parte dele.

- Como ele perdeu o olhinho dele?

- Não sei, essa história é mais antiga que eu.

“Não gosto de falar sobre meu olho... vamos mudar de assunto... continua o carinho... prrr”

- Moço, eu vi uma petshop ali atrás, posso comprar um pouco de ração pra ele? Você tem como carregar?

- Tenho sim moça e acho que ele apreciaria ter uma refeição regular por um tempo. Muito obrigado.

- Então eu vou lá e já volto!

“Prrrrrrrrrr... fica mais moça bonita...”

A mulher volta depois de alguns minutos com um saco de 3 quilos de ração, e um pacote com sachês de ração mole. Olha para o mendigo e diz.

- Aqui estão as coisas para o Fulêro. Para você, toma esse dinheiro - entrega uma nota de R$ 20,00 - Parabéns pela escultura, muito bonita, mas a estrela é o gato!

- Nossa moça.. Muito obrigado mesmo. Generosidade assim não é muito comum de se ver nas ruas.

- Qual o seu nome, moço?

- Me chamo João.

- Prazer, João! Bem, vou indo nessa. Boa sorte pra vocês dois!

“Não vá moça bonita do “pêlo” vermelho!”

- O prazer foi meu moça, quero dizer nosso. Olha como está a cara desse gato!

A moça segue seu caminho com um sorriso no rosto, olhando para trás de vez em quando...

- É Fulêro hoje foi um dia de sorte, ganhamos comida e dá até para tomar uma cervejinha.