Parceria minha e do João Paulo
"hummmmmm... que sono!” - Pensa o gato preto, vira-lata e sem um olho antes de olhar para seu dono. “Será que vamos ficar muito tempo ainda nesse calçadão? Essa movimentação me atrapalha a dormir”. O homem terminava uma imagem de Cristo esculpida na areia, olha a cara do gato acordando meio descontente e pergunta:
- Tá com fome, Fulêro?
“Eu até comeria...” pensa o gato se esfregando nas mãos do mendigo, e depois solta um miado rouco e cansado. “Essas facilidades de ter um dono são ótimas, não sei porque demorei tanto para descolar um.”
Sexta feira é um bom dia, as pessoas vêm à praia e o dono da barraca Marco do Percurso sempre gentil dá uma graninha e um café da manhã pelo trabalho de arte feito na areia, atrativo para turistas. Com a arte terminada o homem caminha tranquilamente até o balcão e comprimenta o dono:
- Bom dia seu Marco! Será que o senhor tem aquele cafézinho para mim e pro Fulêro?
O dono da barraca olha o gato deitado na areia a encará-lo com uma preguiça sobrenatural. O gato se aproxima, sobe no balcão com um salto e se deita perto da caixa registradora. Marco tenta passar a mão na cabeça do gato, mas o felino reage agressivamente, não aceitando o carinho.
“Esses humanos, acham que somos como os cachorros! Os homens têm cães para satisfazer suas próprias carências. Têm gatos para satisfazer às nossas!”
- Perdão pelo comportamento do Fulêro, Sexta feira o movimento começa cedo e ele acorda nesse humor aí.
- Sem problemas. Vou pegar um café com pão para você e para esse porqueira aí um leite com pão.
O dono do estabelimento serve os dois, que devoram a comida e bebida com voracidade. Fulêro ligeiramente mais gracioso que seu dono. Ao terminarem o gato olha para Marco e solta um miado de agradecimento, se limpa e com um salto, sobe no ombro do mendigo e entra na mochila que ele carrega às costas.
“Hora da sesta”.
- Essa é minha deixa seu Marco, muito obrigado pelo café. Até logo!
O homem deixa a barraca aconchegante e volta para a praia. a manhã é agradável e o sol ainda não está tão quente. Ele deita-se sob a sombra de um coqueiro próximo à sua escultura.
Os turistas de Fortaleza vão passando pelo mendigo e apreciando sua arte, uns poucos contribuem com uns trocados. A maioria passa fazendo cara feia, alguns chegandoi inclusive a jogar ofensas como “vai trabalhar, vagabundo”.
Passados algumas horas Fulêro resolve sair da mochila e se deita ao lado do mendigo.
“Está ficando muito quente e a mochila fica muito abafada”
- Esquentou demais lá dentro ou veio me dar apoio moral para a mendicância?
O homem passa a mão gentilmente sob a cabeça do gato uma primeira vez e na segunda dá uma sacudida de leve.
“Vim trazer um ar de beleza para a situação, porque você e essa escultura são horríveis!”
- Não adianta me olhar com essa cara não. Quem sabe com você dando o ar da graça não damos sorte, apesar de você ser preto.
De longe uma moça de cabelos vermelhos vêm se aproximando. A primeira coisa que ela vê é o mendigo e já coloca a mão dentro da bolsa para pegar um trocado. Depois ela vê a escultura e já decide por aumentar a esmola. Por último, visualisa o gato maltrapilho.
- Nossa, esse gato é seu?
E, antes mesmo do mendigo responder se dirige ao gato.
- Psssspsssspsssspssss... shaunim shaunim... Oi gatinho, qual o seu nome?
- Sou o dono dele não moça, esse gato não tem dono. Nos achamos na rua, o encontrei quando uma mulecada dava uma surra nele. Espantei a pivetada e cuidei dele. Mas a decisão de ficar comigo foi dele. O nome dele é Fulêro.
“Oi moça, que cheiro bom têm você” e o gato aceita o carinho da moça. Enquanto ronrona pensa “Que carinho gostoso, diferente do carinho desse brucutu aí!” e pisca o único olho verde para a moça.
- Olha moça eu vou te dizer que isso não é nem um pouco comum da parte dele.
- Como ele perdeu o olhinho dele?
- Não sei, essa história é mais antiga que eu.
“Não gosto de falar sobre meu olho... vamos mudar de assunto... continua o carinho... prrr”
- Moço, eu vi uma petshop ali atrás, posso comprar um pouco de ração pra ele? Você tem como carregar?
- Tenho sim moça e acho que ele apreciaria ter uma refeição regular por um tempo. Muito obrigado.
- Então eu vou lá e já volto!
“Prrrrrrrrrr... fica mais moça bonita...”
A mulher volta depois de alguns minutos com um saco de 3 quilos de ração, e um pacote com sachês de ração mole. Olha para o mendigo e diz.
- Aqui estão as coisas para o Fulêro. Para você, toma esse dinheiro - entrega uma nota de R$ 20,00 - Parabéns pela escultura, muito bonita, mas a estrela é o gato!
- Nossa moça.. Muito obrigado mesmo. Generosidade assim não é muito comum de se ver nas ruas.
- Qual o seu nome, moço?
- Me chamo João.
- Prazer, João! Bem, vou indo nessa. Boa sorte pra vocês dois!
“Não vá moça bonita do “pêlo” vermelho!”
- O prazer foi meu moça, quero dizer nosso. Olha como está a cara desse gato!
A moça segue seu caminho com um sorriso no rosto, olhando para trás de vez em quando...
- É Fulêro hoje foi um dia de sorte, ganhamos comida e dá até para tomar uma cervejinha.