segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Brasília


De olhos fechados respiro fundo, o cheiro do ar frio e seco misturado com a poeira me dizem que estou em casa. Em meus ouvidos as batidas sólidas dos tambores do calango voador, é bom saber que minha cidade tem cultura, tem gente que pensa diferente, age diferente. A distância nos faz valorizar coisas simples, uma postura, um olhar, o clima. Vejo rostos que há muito não via. A recepção é acolhedora, a cidade mais pacífica. Por aqui é possível andar tranquilamente pelas ruas, a cidade me dá a possibilidade de me distrair, me perder por completo em pensamentos, ver beleza nas pessoas. Caminhar por este pais, conhecer lugares realidades e pessoas é libertador, mas há um momento em que ou abraçamos uma nova cidade como nossa ou voltamos para fazer diferente.

As pessoas interessantes que conheci aqui me deixaram mal acostumado. É possível ver nelas profundidade, coerência, bons argumentos numa conversa agradável e despretenciosa. As mulheres não são submissas, são inteligentes de uma forma sofisticada e atraente, elas demonstram seu charme e feminilidade defendendo idéias. As ruas são largas, as pessoas educadas. Para o resto do Brasil Brasília é a capital política desse país, já ouvi opiniões absurdas de pessoas de fora que nos julgam mal, mas isso não é relevante. Brasília é uma cidade cultural e sua mola mestra é a musica. Aqui se faz musica com qualidade e competência dentro dos infinitos gêneros musicais, o espírito dos músicos é revelado em seu som e o que vejo é uma compreensão, mesmo que inconsciente, do ouvinte que se deixa envolver.

O nome da minha cidade é manchado por escândalos políticos, corrupção, preconceito. E nesse cenário, nesse solo pútrido nasce uma flor, a música. Ela é o que resta de mágico nesse mundo, é a expressão do espírito humano livre, puro e simples. Em Brasília as pessoas são musicais, ver algo assim traz certo conforto, me dá esperança.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Conversa de Banco de Praça


Era o fim de uma tarde fria, desejo e desespero caminhavam juntos por uma rua movimentada. Podiam sentir o estado de espírito de cada transeunte e quais os pertenciam. Decidiram-se sentar em uma praça e começar seu jogo. Ambos observaram uma mulher loira, atraente, capaz de deixar qualquer homem louco. Desejo, impulsivo como era disse:

- Aquela me pertence. Sua mente tem ambições que compreendo muito bem. Dinheiro... muita grana, luxo, um homem poderoso. Essa foi fácil.

A mulher meche no cabelo com todo seu charme feminino, solta um sorriso de satisfação imersa em devaneio particulares. Desespero então replica:

- Não tão rápido irmãozinho. Se reparar bem ela tem mais de trinta e cinco anos e começa a entrar em meu domínio. Não namora nem um figurão, sem relacionamento estável, tem um emprego modesto e a solidão que sente só nos torna mais íntimos.

O sorriso desaparece do rosto da mulher, surgem rugas de preocupação e sua caminhada para casa torna-se mais discreta e introspectiva.

Desespero avista um mendigo tocando um violão, meio desafinado, sentado em uma esquina ao lado de um gato preto que os encara balançando o rabo de um jeito que só os felinos sabem fazer. E então diz:

- Aquele ali é meu. O infeliz está em frangalhos, não come uma refeição descente há quatro dias. Não tem parentes vivos e sabe que Quando nossa irmã mais velha vier estará sozinho.

Um homem de cabelos compridos, barba que usava uma camiseta de Robert Jhonson deteve-se diante do homem para ouvir a música que tocava. Era Death Bells do Lightining Hopkins. O cabeludo sorriu com o canto da boca, tirou Cinco reais e mais umas moedas que tinha no bolso, colocou no chapéu do homem. Desejo disse:

- Agora ele é meu. Consegue vislumbrar uma refeição bem servida e uma cachaça para aquecê-lo à noite.

- Desejo, você tem visto nosso irmão mais novo?

- Há muito não o vejo por quê?

- Por nada, ele apenas passou por minha mente agora. Estaríamos ferrados sem ele.

- Verdade, o que seria da humanidade e de nós sem o Sonho.