sexta-feira, 4 de junho de 2010

Caminhar é preciso...


Ano 2010. Hoje foi apenas mais uma tarde de calor. Ao chegar em casa cansado a noite cai pela cidade, o trafego é lento.. O vai e vem dos pedestres me deixa hipnotizado, penso nas variações de minhas emoções, minhas paixões.. Um cachorro quente me espera, que sorte meu camarada fez um panelaço, é bom poder contar com um amigo de vez em quando. Puta que pariu que fome. Enquanto como tranquilamente, ouço as notícias meio distraído. Que merda. Uma puta foi encontrada morta. Viciada. O crack não aparece nas propagandas do governo do estado. Bem vindos turistas, à terra das ilusões. O estado dos Lençóis Maranhenses, da Cultura afro-brasileira, onde suas depravações podem ser realizadas. Como se não bastasse o histórico de exploração e desprezo que essas pessoas já sofreram, os gringos e turistas vem aqui, tiram fotos dos lençóis, das lindas pretas do tambor e caem fora com seus fragmentos de realidade. Tudo o que nos deixam? Uma puta pobre, e provavelmente preta, morta pelo crack. Se bem que alguns gringos ficam, casam-se com uma pretinha e a exploram, como se o que seus antepassados já fizeram não bastasse. Bastardos. Acham que entendem esse país. Gringos... Preciso de uma cerva.

A porra da cerveja ainda está quente.

Às vezes me sento no ônibus, olho as pessoas saindo para trabalhar. Parecem tão adequados às suas vidas, indo para o trabalho com um jeito distraído. Eu cansado, minha barba e cabelos já cobrem a cara quase toda. O trabalho às vezes é cansativo mesmo, mas sempre bom. O que mata é a tempestade de desejos aqui dentro, esse eterno descontentamento, o desejo de mudança. Me sinto o Bukowski sentado sozinho e bebendo do outro lado da rua enquanto o mundo explode. Talvez já esteja nessa cidade há tempo demais e não sei o que vai acontecer.

Agora ela gelou. A cerveja é boa. Confesso que não é a melhor que já tomei. Meu corpo relaxa, estou em casa. É bom sentir-se em casa. O conceito de casa, não é um lugar físico, mas um estado de espírito que te pega desprevenido no meio do furacão em uma Quarta à noite... Preciso ver minha família, não só os de sangue. Sinto falta da companhia deles. Das conversas..

A música me transporta a lugares, lembranças. O Blues é sempre uma boa companhia. Suas variações simples e sólidas, a voz marcante, impossível uma música dessas não deixar uma impressão. Essa é a música dos homens que conhecem as profundezas da nossa natureza. Talvez por isso muitos sejam considerados malditos. Tal compreensão é demais para alguns, mas não para eles. É como se a alma de um homem pudesse ser gravada, suas mazelas, o sentimento diante do caos. Cada fibra do seu ser gravada, compartilhada. Mesmo diante do turbilhão de sentimentos, acordes firmes, calmos, ritmo sólido. É Como se sentir cada nota fosse importante, revelasse uma verdade escondida. Compreender a marcha e continuar. A estrada é longa e as respostas não estão no final esperando por nós. O que interessa é a estrada e o Blues marca o passo da caminhada.

É tarde, o sono ainda não veio. A garganta dói, deve ser uma dessas gripes aí. Passam das três e amanhã o dia começa cedo, não sei se consigo trabalhar amanhã... Essa seria a hora perfeita para um fumante ascender um cigarro, mas não é o caso. O vento manso da janela do meu quarto, a solidão da madrugada, a música da vida noturna, as luzes, os carros. Se para cada cabeça uma sentença, a minha seria Careless Love por Big Walter Horton, minha trilha sonora no momento. O que posso dizer? Sou um dramático por natureza. Um viajante que não sabe mais ficar quieto, minha alma se perdeu na estrada. Caminhar é preciso... é tarde, vou dormir.